São José promove curso de formação de facilitadores de Círculos de Construção de Paz
O Colégio São José promove o Curso de Facilitadores de Círculos de Construção de Paz nos dias 23, 24, 25 e 30 de março e 1º de abril, das 18 às 22h, no auditório do Bloco VI. O objetivo do curso é formar facilitadores para atuação nos Círculos de Construção de Paz Não-conflitivos, promovidos pela escola.
As inscrições podem ser feitas na escola, junto à vice direção. A turma terá o número máximo de 25 participantes. Através da instrumentalização e disponibilização de ferramentas metodológicas, os facilitadores poderão atuar em atividades pedagógicas, na prevenção de conflitos e na identificação de oportunidades de aplicação dos Círculos em suas atividades cotidianas. A formação servirá também como base introdutória para futura formação com atuação em situações conflitivas.
O Projeto de Círculos de Construção de Paz é desenvolvido na escola desde 2018, com o objetivo de solucionar e, sobretudo, prevenir questões conflitivas dentro do âmbito escolar.
O que é Círculo de Construção de Paz?
Para explicar melhor o que é o Círculo de Construção de Paz, bem como a sua veia matriz, a Justiça Restaurativa, fomos conversar com o desembargador Leoberto Brancher, que há mais de duas décadas estuda profundamente o tema e é um dos responsáveis pela sua aplicação na Justiça Criminal brasileira e também no âmbito escolar.
Conforme ele, a Justiça Restaurativa tem diferentes metodologias para promover o diálogo e uma delas chama-se Círculos de Construção de Paz. “É uma metodologia baseada nas tradições indígenas do Canadá, que foi sistematizada a partir das experiências de um juiz canadense e trazida das tribos para aplicação na Justiça Restaurativa. Ela tem uma característica comunitária de solução consensual e tem uma qualidade que é a possibilidade de promovermos círculos de diálogos não conflitivos, com os mais diversos temas”, aponta.
O magistrado explica que a Justiça Restaurativa aos poucos tem ganhado espaço na área da educação, em virtude de uma demanda de pacificação das escolas. “A desordem emocional dos alunos, até mesmo na relação dos pais com a escola, tem sido muito perturbadora para o ambiente acadêmico, assim como para o desempenho dos alunos e para a qualidade da saúde mental dos professores. E o que a Justiça Restaurativa propõe, enquanto modelo filosófico, é que nós somos as pessoas pelas quais estamos esperando. Saímos daquele modelo piramidal de uma hierarquia estruturada, olhamos para as pessoas e perguntamos o que pode ser feito? Isso tanto entre professores quanto entre os alunos, exercitando essa capacidade dialógica, habilidade para a qual somos pouco treinados”.
Brancher observa que no âmbito escolar a abordagem restaurativa pode mostrar que, muitas vezes, um aluno que agrediu o outro também estava sendo vítima de bullying ou de agressões em família ou é vítima de um pai alcóolatra que violenta a mãe, por exemplo. “Em muitos casos, o agressor está sendo vítima de agressão por muito tempo e explode, numa atitude agressiva, como que num pedido de ajuda para que a atenção seja voltada pra ele. O modelo tradicional de justiça potencializa sentimentos de hostilidade, tentativa de ocultamento, raiva e rancor. Todavia, quando trabalhamos com a outra equação, a Justiça Restaurativa, temos a chance de apaziguar emocionalmente esse contexto e mudar esses sentimentos, promovendo perspectivas de paz”, observa o especialista.
Justiça Restaurativa – origem
A justiça restaurativa, como conceito, vem se propagando no Brasil desde o início deste século, mas, oficialmente, a partir de 2005, ainda muito ligada ao sistema de justiça. Conforme Brancher, ela nasce em um campo de discussão da Justiça Criminal, em questionamento a pouca eficácia das intervenções punitivas, no que se refere ao acertamento das relações que são causadoras e que também são consequências de um crime, uma infração. “O primeiro aspecto que ela levanta é perguntar para a vítima: qual a sua necessidade? O que você sentiu? Qual foi o dano causado? E perguntar para o infrator o que ele faria para reparar esse dano. Isso já traz uma mudança de foco da discussão jurídica, da lei, para o campo das relações interpessoais, do humano. Tira aquela perspectiva de punição como resposta automática e coloca em pauta a reparação de danos. Isso não somente vai cuidar com mais atenção das necessidades da vítima, como também vai olhar para o ofensor com maior autonomia. Porque simplesmente o submetermos a uma punição é uma atitude passiva a qual ele tem que se submeter. Então, se você diz a ele o que pode fazer para reparar esse dano, é uma atitude proativa e ele terá que dar algo de si para recuperar o mal causado”.
A Justiça Restaurativa é uma das linhas que coloca em discussão essa visão da criminologia crítica. “Aqui, basicamente, o que se propõe é a mudança da formula básica de equacionamento: a matriz tradicional trabalha com a ideia de culpa, de perseguição de culpado, da imposição de um castigo, baseado na força coercitiva do Estado, como método de adequação de comportamento. Já a Justiça Restaurativa vai trocar esse componente da culpa pela responsabilidade. Ao invés de uma perseguição do culpado, promove-se o encontro. Ao invés da imposição, o diálogo. Mas tudo isso só acontece se a pessoa assume o que fez. Assim, ao invés do castigo, teremos a reparação do dano; ao invés da coerção, que é a força de submeter o outro, teremos outro componente de força que é a coesão, a força da estabilização que o consenso produz”, explica.
O magistrado aponta que as experiências de quem participa desse processo são positivas. Segundo ele, existe uma redução de reincidência com relação ao infrator, e existe um processo de melhor superação da experiência traumática mais libertadora das vítimas. “Tem um ganho em termos de ressignificação de um sistema. Tem um ganho em termos de benefícios diretos para quem participa. É mais comum que participem desse processo que envolve a Justiça Restaurativa aqueles que já têm uma relação prévia, ou de vizinhança ou de trabalho, enfim, que possuam algum vínculo, relação ou proximidade”, conclui Brancher.